12 de março de 2024

A FORÇA DA FÉ

 

Deck of Meteora


                  -   Tais Luso de Carvalho

 

       Faz algum tempo que fui à Igreja, a mesma que meus pais frequentavam, a mesma igreja que me casei – Igreja Santa Teresinha. Sentei no banco em que meus pais costumavam sentar. Senti eles tão perto de mim que tive vontade de saber deles, como está a vida lá em cima, onde estão.

Anos antes do falecimento de minha mãe, havia pedido a ela que, quando “partisse”, desse um jeito de vir me contar como ela estaria lá do outro lado, isso rendeu muitas risadas entre nós duas. Ela brincava muito com esse assunto, pois não revelava medo da morte, afirmando que deveria ser melhor do que nessa bagunça onde vivemos.

Saudades, tanta vontade de ver meus pais, de abrir meu coração! Lembranças dos valores que passaram para minha formação. E sou grata a eles por tudo.

Meu pai era um médico de muita Fé, achava importante ter uma religião, uma crença. Ter Fé. Segundo os médicos, a Fé é de grande importância na vida das pessoas.

Porém, eu questionava muito e não via claramente o sentido em nascer, viver, construir uma vida inteira, dar vida a outras vidas e depois, um ponto final! Isso eu já questionava, ainda adolescente, nas aulas de religião no colégio das freiras. E meu pai me dizia: minha filha, isto não tem resposta, isto é FÉ!

Mas voltando à igreja Santa Teresinha, onde eu estava sentada, olhei para o lado, onde ficam os confessionários, ali onde os padres escutam os pecados do mundo, dão o perdão e a penitência que nos cabe e depois voltarmos a fazer tudo novamente.

Dali, onde eu estava, fiquei observando um velhinho que mal conseguiu chegar ao confessionário, arrastava-se com enorme dificuldade. Fiquei pensando na tristeza daquele ato; que difícil foi chegar e ajoelhar-se! Que pecado teria cometido aquele senhor, no crepúsculo de sua vida, já tendo a despedida tão próxima? Talvez ele sentisse a necessidade da presença do padre para interceder o perdão junto a Deus afinal, foi assim que aprendemos.

Depois disso voltou a imagem de meu pai. Se ele estivesse vivo, vendo essa cena comigo, certamente diria:

Minha filha, isso é apenas um ato de Fé, a mais pura Fé.




Roberto Carlos / Luciano Pavarotti

Ave Maria


 



28 de fevereiro de 2024

ENSINAMENTOS DO TEMPO

 

   Palmeiras Imperiais - Av. Osvaldo Aranha - Porto Alegre / Brasil      


                              - Taís Luso de Carvalho


Hoje pela manhã, estava vendo alguns vídeos da bela Veneza enquanto Charles Aznavour cantava "Que c'est triste Venise". Veneza e o Velho Mundo… tão linda! Nossas vidas são povoadas por expectativas, algumas tristezas, frustrações, mas também por muitas alegrias. Por vezes, certas coisas incomodam muito, mas fazem parte da nossa bagagem.

Mais tarde, dando uma volta pelo meu bairro, recordei minha infância, minha adolescência no esporte que abracei, meus queridos pais, o início do meu casamento, de meus filhos ainda pequeninos e pensando num futuro que nem imagino. Em pouco tempo estava com meu baú aberto revirando todas minhas lembranças, tudo ajeitado e algumas coisas já esquecidas. Parei defronte ao prédio em que morei com meus pais, e também pelo lugar onde meus avós moraram quando nasci – hoje um prédio de apartamentos. Muitos pensamentos me acompanharam no passeio, tantas árvores floridas, o belo parque da Redenção, a avenida com as famosas Palmeiras Imperiais e as inúmeras construções antigas, tão familiarizadas. Tive a sensação de que tudo era meu, mas que um dia deixarão de ser...

São pensamentos difíceis de serem dominados, que chegam sem pedir licença. Além disso, surgem alguns questionamentos como as revisões de páginas, um balanço da vida. Pensando bem, entrei numa de filosofar sobre minha vida e concluí que lembrar do passado é saudável, mas não viver dele. Apesar de viver um dia de cada vez, não me esquivo em pensar e recordar. Mas nada se desarrumou, pois minhas perdas já assimilei, e tudo se aquietou no velho baú.

Como já estamos bem informatizados, quem sabe a gente não aprende, sem muito esforço, a deletar alguns arquivos que não  fazem mais falta?

Os anos levam nossa juventude, mas não tenho dúvidas que nessa troca, o nosso reservatório de experiências conta muitos pontos. É preciso sempre colorir a vida de esperança, de alegria e confiança, o que é plenamente possível se tivermos confiança e determinação nos nossos atos.


 






 

17 de fevereiro de 2024

LIÇÕES DE VIDA

 

              O Nascimento De Um Novo Homem - 1943 / Salvador Dali -                  

OBRA: DAS ARTES



LIÇÕES DE VIDA

      - Tais Luso de Carvalho



Numa época da minha vida, lá pelos meus 14 anos, e lá se vão décadas, eu achei curioso uma amiga de minha mãe dizer a ela que estava em “crise existencial”. Eu escutei, estava perto. Adolescente gosta de tudo que é diferente. Mas logo aquela amiga, sempre alegre e divertida, em crise existencial? Aquela amiga de minha mãe me encantou ao desnudar sua alma, desvendar os porquês da sua vida e o que a deixava aflita. Estava muito sofrida. Complicadas e indecifráveis posturas na vida sempre despertaram a curiosidade dos adolescentes.

Muitos problemas nossos, que não conseguimos clarear, têm endereço conhecido: Terapeuta! Mas hoje estamos mais abertos a comentar nossos problemas com amigas e amigos. Naquela época não era costume abrirmos muito as comportas. Hoje a coisa está mais solta. Alguns problemas, resolvíamos numa boa, mas outros, ao não compartilharmos, era uma tristeza sem fim. Não é bom guardar problemas.

Atualmente, o Brasil também vive uma crise existencial, está à beira de um colapso, mas tudo continua lindo para muitos, desde que o sol brilhe, o mar amanse e o carnaval traga lindas ilusões: “reis e rainhas” felizes na passarela...

A enorme crise política, está longe de encontrar o fio da meada. E cada um vai vivendo, como pode, aos trancos e barrancos, com seu coração patriota em nome da Democracia.

Na verdade, a situação está bastante paranoica. Algumas pessoas dizem que pararam de ler jornais, de escutar rádio, de ver os noticiosos na televisão. Facilmente as conversas descambam e o “bom clima” acaba. Cada um tem seu político de estimação. E é em sua defesa que nasce o ódio do momento entre os eleitores.

Um pouquinho só de paz, mesmo em doses homeopáticas já faria diferença. Como estamos num ano de eleições é muito difícil ficarmos alheios a tudo, ainda mais quando as coisas estão explodindo.

A política é a arte de dialogar, de governar com responsabilidade e com sensibilidade para que o povo seja feliz! Infelizmente as demonstrações de aversão, ódio e ressentimentos, estão em alta, mas na verdade não agradam mais a ninguém.

Enquanto permanecer essa perigosa polarização, a paz fica difícil.









4 de fevereiro de 2024

COISAS DE TURISTAS

 

Coisas de Turistas



                      - Taís Luso de Carvalho   

Sem dúvida que conhecemos um turista de longe: um ser deslumbrado, feliz, vestindo um bermudão ou abrigo, tênis ou sandália com meia, camisa solta, rindo não sei de quê e clicando tudo. O nosso lado de turista é cômico: meu pai fotografou minha mãe ao lado do 'segurança' da Casa Rosada (Sede do Governo da Argentina). Achei cômico aquilo! Não acreditei. Acho que ela pensou que turista podia tudo, até levar uma lembrancinha dos Hermanos Gaúchos do Palácio do Governo. Sorte que o segurança foi simpático. 

Lembro que a cada cidade visitada  eu fazia planos para morar. Sonhava com uma casa num lugar maravilhoso, com exuberante natureza. Até hoje minha família não esqueceu daqueles meus delírios. Na verdade, eu acho que naquela idade o que eu queria mesmo era me mudar para um outro planeta, se possível fosse. 

É próprio do turista pensar que só existem maravilhas na terra dos outros. O turista já sai do seu lugar de origem com uma ideia preconcebida: longe está o luxo, o exótico, o fantástico, a bela Arte, belas praias... Tudo para ser admirado!

Não existe turista que não se entupa com as pequenas lembranças dos lugares por onde vai passando. Há muito tempo - nos meus 18 anos - viajei para a Europa. De Paris trouxe  alguns souvenirs do Louvre - uma imagem pequena do quadro da Mona Lisa - Leonardo da Vinci,  uma réplica da Torre Eiffel que se desmontou pelo caminho e outras coisinhas mais. A Torre deveria ter sido embrulhada com mais  proteção.

O mais hilário foi meu retrato de corpo inteiro e com um saquinho de batatas fritas, retratado por um artista da praça de Montmartre. Trouxe com tanto entusiasmo que parecia que eu estava trazendo uma obra de Renoir! O turista não tem idade, ele é o mesmo sempre. E, está no seu pleno direito, entrar num Louvre balança muito nossas emoções.

Certas coisas beiram o cômico, muitas pessoas trazem pedrinhas do Egito, folhinhas do Monte das Oliveiras etc.  Um jovem tenista trouxe um punhado de grama da quadra de tênis de Wimbledon.   Eu trouxe quilos de inutilidades, hoje, só conservo as fotos.

Aos domingos, aqui em minha cidade, almoçamos em restaurantes nas imediações de um lindo parque da capital. Lugares aconchegantes, onde artistas expõem seus trabalhos, antiquários vendem suas belíssimas peças, cantores fazem seu show na rua, os pets passeiam com seus donos, crianças felizes e muitos encontros entre  amigos, artistas e conhecidos. Se fosse em outro lugar, numa rota turística, seria algo fenomenal! No fundo todos somos iguais. Gostamos de desbravar o desconhecido

Bem, mas onde quero chegar com esta crônica? É óbvio que é prazeroso viajar. Mas temos uma mania fixa de valorizar a terra dos outros e esquecemos que o lugar em que vivemos e que assentamos nossas raízes, também é maravilhoso. O triste é quando o homem coloca a mão e destrói tudo; não fica pedra sobre pedra.  Naturalmente me emociono quando vejo o passado preservado.

O melhor de tudo é sentar numa praça movimentada e ficar observando as pessoas, o movimento das cidades, o pôr do sol na belíssima Orla do nosso rio Guaíba, e o vem e vai do cotidiano de vários lugares.  Percebe- se que a vida das pessoas  se parecem muito.

Lembro do momento em que  voltei da Alemanha para o Brasil,  o avião entrou em céu brasileiro - eu chorei; constatei a força das minhas raízes. Isso é muito forte e muito bom o amor que sentimos pelo nosso lugar.

Mas hoje, bem mais amadurecida, tenho minha cidade, minha Terra como o melhor lugar do mundo para mim, e peço a ela mil anos de perdão se algum dia vacilei por seus encantos.






29 de janeiro de 2024

UMA TARDE NO SHOPPING

 

Dimas Florêncio - Porto Alegre / Brasil      aqui: Das Artes


                        - Tais Luso de Carvalho


Gosto de escrever sobre coisas simples do nosso cotidiano, porque de alguma maneira todos nós passamos por situações semelhantes, umas tristes, mas outras de tão tolas chegam a ser hilárias. Mesmo assim prefiro rir de besteiras do que chorar de indignação. Já basta esse meu país mergulhado num mar de lágrimas.

Pois ontem fui às compras. Foi-se o tempo em que eu zanzava de salto alto dentro de um shopping. Então saí à procura de sapatos baixos.

Já cansada de tanto olhar, entrei numa loja onde vi um sapatinho vermelho, enfim meu estilo, daqueles tipo Neon, que se enxerga a 200 metros no escuro. Discreto? Não, tem de haver uma compensação: baixo sim, discreto jamais! Mas lá veio a atendente com um número menor do que eu pedi...

Moça, eu pedi o 35, esse  número 34  é pequeno!

Não temos 35 senhora, mas o 34 vai ceder, o couro é muito macio, pode levar!

Nunca tinha escutado isso, mas optei por ficar calada... Segui o caminho. Entrei numa loja com com vários CDs e ainda disco Vinil para os colecionadores. Pedi CD de música instrumental. Só consigo escrever com esse tipo de música ao fundo, escutar voz me atrapalha. A moça olhou pra mim, pegou o CD do Chitão e Xororó (dupla de sertanejos) e disse:

Adoro esse, senhora, são ótimos!

Moça, eu não gosto  disso! Não há música  instrumental, os clássicos?

Desanimada e já cansada de estar andando há horas, segui caminhando e dei de cara com uma blusa do meu estilo. Bah, enfim! Pedi tamanho  'M'. E lá veio a atendente com várias blusas... Fiquei tão feliz que pensei em levar uma de cada cor! Porém...

Mas moça, tamanho G (grande)?

Mas encolhe, senhora; tenho uma igualzinha! Na primeira lavagem já encolhe.

Mas então deve ser uma blusa muito vagabunda! - disse eu, bem irritada.

Rodar a baiana’, num momento desses, seria uma terapia! Mas não quis pegar pesado, pesei as minhas atitudes e escolhi a melhor: sair da loja.

Depois de muito caminhar, vim para casa. Cheguei aqui, coloquei a chave na porta e ouvi uma voz que me esperava para curtirmos nosso café:

Você deve estar cansada!! Comprou o shopping?

Por hoje nada, querido!

Mas você é muito exigente!

Ah, sim, talvez volte para pegar um livro de autoajuda !

Autoajuda? Não encontrou outra coisa?

Não; fui atendida por  gente de outro planeta.

Ficou rindo, e eu quase explodindo de mau humor

Coisas da vida.







20 de janeiro de 2024

HOJE FILHOS, AMANHÃ PAIS !

A Família - Lasar Segall / 1891 - 1957



                                 - Taís Luso de Carvalho


A fase da infância permanece muito forte na nossa memória, nesse nosso longo andar.

Sem dúvida, jamais esqueceremos daqueles tempos saudosos, dias muito felizes com nossos pais e parentes. Mas, como nem tudo são flores, há também o lado dolorido da infância, pois criança quando quer... quer, e conforme as coisas abrem um "bocão" em qualquer lugar, seja no ônibus, no avião, no supermercado, no shopping ou numa Igreja. A palavra “não” para muitas crianças vira tortura e escândalo!

Mas a vida nunca foi fácil para ninguém, alguns lembram apenas de tempos complicados; outros, lembram mais de coisas positivas que aconteceram em suas vidas.

Muitos filhos acham que foram os escolhidos para as desventuras, para as desgraças, para a ausência de sua felicidade. Por outro lado, os pais também dão seus tropeços, mas vejo isso com naturalidade, quando não há maus tratos no relacionamento. O importante é o amor presente.

Mas, chega a hora que mudamos de lado, deixamos de ser filhos para sermos pais. Não são os pais e filhos que erram, o ser humano em qualquer fase de suas vidas mostra suas falhas. Porém, há situações que não merecem ser carregadas no coração e na mente para o resto de nossas vidas. Tempos felizes e tempos difíceis, assim é a vida de todos nós no planetinha. 

Muitas pessoas na condição de filhos, ainda em formação,  pensam subirem um Calvário, que são os azarados sobre a Terra, e estão prontos a julgar e condenar seus pais e o mundo inteiro. Sentem-se aliviados quando julgam e condenam. Vira vício. 

Se os filhos olhassem  para seus pais, com um pouco de generosidade, saberiam que educar não é tarefa fácil. Educar é prazer,  amor, mas também muita preocupação e responsabilidade para que os filhos cresçam corajosos, generosos, saudáveis de corpo e mente.

Na verdade, as pessoas buscam viver com paz e morrer com dignidade, salvo as exceções. Esse é o nosso foco, encarar as dificuldades nos fortalece. Não vale a pena reviver mágoas passadas e andar caçando culpados pelas nossas frustrações ou nossa vulnerabilidade.

Vejo que para muitas pessoas a felicidade é difícil por viverem mais no passado do que no presente.

Lembro-me de algumas obras de arte que me pareciam belas, quando vistas de longe, mas ao chegar bem perto, não eram tão belas quanto me pareciam: traços pesados, sem leveza, sem encanto. Isso existe, é fato.

E assim é a vida, e assim também  somos nós.







2 de janeiro de 2024

EM BUSCA DA SONHADA PAZ

 




                      - Taís  Luso de Carvalho


Pois é, amigos, difícil escrever nos primeiros dias do  Novo Ano, período em que nada mudou, as coisas continuam bastante conturbadas, com milhões de pessoas a sofrerem com guerras infames, outras na pobreza extrema, abandonadas, morrendo em total desumanidade. Mas é assim que caminha o nosso mundinho, cego e infeliz - como sempre. Tão cego que muitos não percebem que vivem, ainda, como Bárbaros que lembram aquele triste período de incultos e selvagens da nossa História. Sinto que vivo num mundo que não aprendeu nada com outras Guerras, com outras tantas atrocidades.

Não abraçarei discussões onde o ódio é o centro dos sentimentos, seja no campo político, ideológico, seja no religioso, nos esportes ou em outro campo qualquer de ideias, onde as pessoas se matam. Gerar discussões com uma carga enorme de ódio,  é improdutivo. Prefiro ser uma feliz e discreta vivente, coerente com minhas ideias, sim, mas não como Grilos Falantes impondo, brigando, se desgastando e com sua felicidade comprometida. Não sou política, jamais seria, teria de ter um estômago de aço, tamanha a minha decepção e descrença. Com exceções, é claro.

Vejo que as sociedades se desmontam quando as pessoas se agridem sem limites, quando seguem o rebanho  induzidas a se posicionarem  em redes sociais. E pergunto:  por que essa persistência em agredir? Por que tanta infelicidade?

Nesse início de ano, que está entrando, tenho apenas um foco: ser feliz!   Coisas simples, mas prazerosas. Inofensivas. 

Viver com leveza é um privilégio; exercer a solidariedade, conseguir a paz interior é maravilhoso, nem sempre se consegue por longo tempo, ninguém é possuidor de uma paz constante (percebo ser mais atitude do que pensamento), mas é preciso tentar, insistir, já que a vida é muito curta para sermos infelizes.  E isso é o que quero para mim e para todos. 

 O que é mais admirável numa pessoa é a delicadeza de seus atos; a delicadeza e o respeito no trato com os outros. Depois... que venham as outras virtudes que serão muito aplaudidas.

Sejam felizes, queridos amigos, a Paz de Espírito  significa  "Vida  longa"!









17 de dezembro de 2023

UMA REFLEXÃO SOBRE A VIDA

 

Rio Guaíba - Porto Alegre RS / Brasil


                                              UMA REFLEXÃO SOBRE A VIDA

                                     - Taís Luso de Carvalho


      Não sei qual a razão, mas quando rimos sem travas, brota em nosso rosto toda a alegria do mundo.  Quando somos acometidos de um ataque de riso, daqueles difíceis de parar, e quando percebemos que a "coisa" disparou, mais rimos. Pode ser constrangedor, mas delicioso.

Porém, quando emergimos de uma grande tristeza, vem um choro sentido, e tudo se torna tão dramático que mais parece o fim dos tempos. O fim do mundo. Tapamos o rosto com as mãos, procuramos esconder as lágrimas, tentando esconder as nossas profundezas. Mas assim somos: rimos escancaradamente, mas choramos com constrangimento. Dói mostrar a dor que por hora sentimos. Parece que algumas dores vêm para humilhar. Para acabar com nossa autoestima.

Mas certas emoções são tristemente lindas. Os poetas sabem disso, e nos tocam muito colocando em versos as tristezas e agonias do mundo. Nossas emoções também se fazem presentes através da música. Umas nos remetem à euforia, mas outras, à introspecção - momentos mais contidos. E ao escutá-las sinto-me enternecida e tomada por um sentimento que me eleva, momentos só meus. Não escuto música com o objetivo de me alegrar, não sou triste. Mas minha alma pede melodias que me sensibilizem, que me afaguem, que me deixem tranquila.

Fantasie, de Chopin tornou-se um suporte para minhas dúvidas, minhas indagações perante o desconhecido. Beethoven, Vivaldi, Mozart, Bach e tantos outros me completam.

Vim para frente da tela escrever um texto diferente desse, mas escutando Adeste Fidelis, Nessun Dorma, as Ave-Marias de Gounod, de Shubert, de Donati, dei uma volta, e não saiu o texto que tinha em mente. Travei. Essas melodias me fazem perceber o quanto pequena sou diante de tanta complexidade nessa imensidão em que vivemos. São nesses momentos que esqueço das maldades do mundo e penso na genialidade humana, das maravilhas de que somos capazes. E por tudo isso, já bate uma saudade do tempo, bate uma saudade da minha outra metade que o tempo já levou.

São nesses momentos, de plena sintonia, que penso o que não deveria pensar: gostaria que tudo parasse, e que nossas vidas não fossem finitas. E lamento termos nascido com essa cruel percepção de finitude. E essa agonia só acontece conosco, porque somos os únicos racionais.

Lembro do último ano de vida de meu pai, homem de uma fé inabalável, e lembro do dia que o encontrei chorando…

– Paizinho… se sabes para onde vais, e que o Paraíso é maravilhoso ao lado de Deus, por que choras, pai?

– Choro por deixar vocês, filha...

E choramos juntos; fiquei sem saber mais nada. Na época, eu não tinha a noção do que seria uma perda desse porte.

Mas, enfim, nada temos a fazer a não ser lutarmos pela felicidade, enquanto a vida perdurar. É o mínimo que temos a fazer.


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( edição 2016) 

Boas Festas a todos os queridos amigos e leitores, que o Novo Ano - 2024 - traga a todos nós muita saúde,  paz e felicidade! Meu carinho e um abraço a todos!




 Adeste Fideles / por  Helene Fischer 





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4 de dezembro de 2023

DE LONGE TUDO PARECE PERFEITO ...

 



      - Tais Luso de Carvalho


Quando passeio pelos bairros da minha cidade, meus olhos vão descobrindo alguns terraços cheios de flores, janelas com cortinas de crochê e bebedouros para os bem-te-vis. Um encanto! E a cada dia que faço esses passeios parece que esses terraços e jardins são mais festivos,  que existem pessoas muito felizes naquelas casas. O sol, as flores, os bem-te-vis... Naturalmente,  imagino e fantasio a vida de cada um daqueles recantos vistos com alegria de quem apenas passa.

O que estarão fazendo os moradores daquelas casas e apartamentos? Serão realmente felizes? É difícil imaginar que por detrás daqueles jardins encantados, daqueles terraços floridos possa existir alguém triste, solitário e com uma montanha de problemas. Mas existem; as flores e os bem-te-vis podem estar escondendo uma outra realidade, que eu não imagino no seu interior.

Mas gosto de ver, são momentos de ilusão, uma vez que me afasta da violência da cidade, das encrencas entre as pessoas e me permite pensar que a vida se apresenta maravilhosa por mais tempo. Deve ser o poder das flores.

Percebi que só tive esta ilusão porque supervalorizei o que estava longe. O que é inacessível e desconhecido aos outros, torna-se misterioso, parece perfeito.

Fico curiosa com biografias de grandes nomes e tenho interesse pelos aspectos ocultos de grandes vultos, de cientistas e pensadores que fizeram a história da humanidade. Os ídolos nunca são nossos iguais: precisam ficar no patamar da nossa admiração, protegidos da curiosidade humana, envoltos num mistério que nos fascina. No momento que se desnudam aos nossos olhos, a coisa muda.

Por isso, não gostaria de adentrar nos terraços dos belos apartamentos, nos jardins das casas. Continuarei olhando as flores, os bem-te-vis e pensarei, por momentos, que o caminho que tracei para passear é um percurso lindo, alegre e que alimenta meus sonhos num mundo imaginado. Depois volto à realidade, pronta para levar o dia, com seu lado alegre e outro nem tanto, afinal, não é aqui o Paraíso.








25 de novembro de 2023

ISSO É DE UTILIDADE PÚBLICA!

 




                - Tais Luso de Carvalho


     Ontem foi um dos dias que resolvi enlouquecer. Mas enlouquecer consciente! Pois bem...

Uma loja de departamentos, de uma rede muito conhecida no Brasil, há mais de 4 semanas me telefonava, diariamente, perguntando por uma tal de Juralva: queria falar com a Juralva sobre seu débito. Dizia eu, nas 4 semanas, que aqui não morava e nunca existiu uma Juralva. Mas não adiantou, a mulher queria a Juralva a qualquer preço. Não dava mais para ouvir a voz daquela mulher, eu já estava de saco cheio.

Lembro que perguntei algumas informações, e a pior telefonista do mundo respondeu:

- Não podemos dar maiores detalhes.

- Mas escuta... eu não quero detalhes, eu...

- Não podemos dar maiores detalhes, senhora.

- Mas como o meu telefone foi parar aí?

- Não podemos dar detalhes.

- Mas o que vou fazer?? Eu não conheço a Juralva!

- Não sabemos, senhora...

- Mas...

E a infeliz, desligou. Mas espera, aquilo não seria uma gravação? Não, não era.

Telefonei para outro setor da loja e pedi que tirassem meu telefone do cadastro, houve um engano... Mas, não! Não podiam dar detalhes! Enlouqueci pelo fato de não me escutarem. Até quando iria essa coisa enlouquecedora?

O que poderia eu fazer? Primeiro pensei em não me estressar, manter-me calmíssima, este foi o primeiro passo. E pensei uma coisinha que deu resultado e compartilho com vocês: podem usar, é de graça! Mas, quando isso ocorrer, anotem o número da chamada.

Tocou o telefone. Era do 0x11 de São Paulo... o próprio:

- Alooooou, por favor, a Juralva...

Apressei-me a responder:

- Aqui é do Hospício São Pedro de Porto Alegre:

disque 1, para Internação;

disque 2, para Marcação de Consulta;

disque 3, para Enfermaria;

disque 4, para falar com um louco...

Além de eu ter lavado a alma vi que a mulher sumiu ! Nunca mais tive o "prazer" de atendê-la!

Mas depois disso fiquei um tanto curiosa: será que acharam a Juralva? O que aconteceu? Pensei em discar para o 0x11 e perguntar se encontraram a Juralva!

Dizem que a curiosidade é a cura para o tédio...

Deus que me livre...







15 de novembro de 2023

CARLOS DRUMMOND - AMAR


Escultura em bronze, Carlos Drummond, Av Atlantica - Rio de Janeiro


AMAR         

                                         - Carlos Drummond de Andrade



Que pode uma criatura senão,

entre criaturas, amar?

amar e esquecer,

amar e malamar,

amar, desamar, amar?

sempre, e até de olhos vidrados, amar?



Que pode, pergunto, o ser amoroso,

sozinho, em rotação universal, senão

rodar também, e amar?

amar o que o mar traz à praia,

o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,

é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?



Amar solenemente as palmas do deserto,

o que é entrega ou adoração expectante,

e amar o inóspito, o áspero,

um vaso sem flor, um chão de ferro,

e o peito inerte, e a rua vista em sonho, 

e uma ave de rapina.



Este o nosso destino: amor sem conta,

distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,

doação ilimitada a uma completa ingratidão,

e na concha vazia do amor a procura medrosa,

paciente, de mais e mais amor.



Amar a nossa falta mesma de amor, e na

secura nossa

amar a água implícita, e o beijo tácito, e a

sede infinita.




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Fonte: Carlos Drummond de Andrade, 1902 – 1987

A Palavra mágica / 13ªed. Rio de Janeiro – São Paulo

- pág 43 / Record. 2007








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2 de novembro de 2023

DO SONHO À REALIDADE


 

DO SONHO À REALIDADE

                                    - Taís Luso de Carvalho



É claro que não tem como vivermos em estado de poesia, mas sonhar é preciso! E o que é sonhar, afinal, senão o melhor, o mais prazeroso estado d'alma?

A "maturidade" nos ensina a querer apenas o que nos falta, tranquilidade, alegria, calor humano, saúde e paz. Mais alguma coisa? Já não mais, não temos mais o direito de pensar bobagens, o supérfluo da vida. Chegou a hora do desapego  de coisas irrelevantes. Lembro quando resolvi, há mais de 20 anos,  colecionar  com certo orgulho, centenas de corujas. Fui comprando e outras corujinhas fui ganhando a cada data importante. Era só coruja, terrível! Ninguém mais pensava: era coruja - direto! Bateu-me um desespero! Encheram-me de corujas como eu nunca havia imaginado. Chegou um dia que olhei para todas, para aquele armário alto e com espelho atrás que duplicava o número de corujas, de todos os tamanhos e formas, e me perguntei para que tudo aquilo, tanto trabalho? O que representavam no decorrer de anos, senão apenas enfeites em demasia? Refleti. Passado alguns anos, começou o meu desespero de tantos bichos e um desapego de muitas coisas, muitos enfeites que possuía - apenas o valor da matéria. Um exagero.

Passei a olhar mais profundo, a buscar em mim o importante, o mais saudável, os sentimentos de solidariedade, de compaixão, de amor. Correr em direção à felicidade não é coisa fácil, ela se apresenta em doses homeopáticas. Como passar por essa vida, ver tanta desgraça e me omitir, quando necessário é me doar?

A felicidade precisa ser cultivada, precisa de muitos cuidados e de carinho para permanecer conosco. Não será essa busca parecida com os poemas dos grandes Poetas, que nos deixaram os moldes do belo e da perfeição?

Seguirei nessa busca, mesmo sabendo que não atingirei o ideal, mas o caminho pode ficar mais bonito. Quem sabe mais colorido e mais leve.




André Proulx - Toselli Serenade